O isolamento, a altitude acentuada, a escassez de água e espaço tornam a Serra Fina uma das travessias + difíceis e emocionantes do Brasil, cujo ponto alto é a subida da Pedra da Mina, pico culminante da Mantiqueira. Se assim já é difícil, imagine realizá-la no sentido Norte-Sul, transversalmente? Pois foi isso mesmo q fizemos em 5 árduos dias: saímos de Queluz, escalaminhamos o Rio Claro até sua nascente por encostas repletas de mato e pedras escorregadias feito sabão, ate atingir o cume da 4º maior montanha do país, p/ depois descê-la pela crista oposta rumo Bairro do Paiolinho. Radical, selvagem e intensa ao extremo, enfrenta-se paredões verticais íngremes, abre-se c/ facão mata fechada e embrenha-se por mares de capim-de-anta afiados, alem de enfrentar frio e vento cortante c/ temperaturas negativas. Preço justo q se paga p/ fazer parte dos poucos q já conquistaram os 2.798m da Pedra da Mina desta forma nada convencional. Tudo isso emoldurado por montanhas acima dos 2mil metros. Alem de proporcionar novas vistas espetaculares da região + alta do estado, de incontáveis cachus e piscinões de água límpida, esta pernada se caracteriza tb por ser + longa, + difícil,+ bonita. E muito, muito + perigosa.

1º DIA - CHEGANDO NO RIO CLARO
Foram 2 longos anos de planejamento, mas principalmente de negociações c/ o dono da fazenda p/ obter permissão de acesso ao inicio da trilha. Pensávamos q fosse exagero de sua parte mas estávamos enganados. Tal cautela c/ restrições a estranhos é + q justificada diante das adversidades do trajeto, já q a maioria das pessoas volta dessa travessia s/ conclui-la, de maca. Uma vez assinado um 'termo de responsabilidade' cujas clausulas por si já desmotivariam qq um ('..em caso de falecimento..') c/ itens redundantes alertando dos riscos constantes de lesões corporais, é q bastou combinar datas q coincidissem c/ tempo bom, e pé-na-trilha!
Assim eu, o Ângelo e o Guto desembarcamos em Queluz, onde o Ricardo já nos aguardava, as 12:30. Meia hr depois já sacolejavamos no táxi do Seu Sebastião q - serpenteando morros desnudos por estrada poeirenta - nos permitia 1º contato visual c/ nosso magnânimo objetivo. A enorme muralha da Mantiqueira se impunha de tal forma q nos sentimos acanhados diante de tanta imponência. O sol daquela tarde de quinta-feira e um céu isento de nuvens permitiam visibilidade total da Pedra da Mina, q parece inacessível daquela perspectiva, mas q ao mesmo tempo parecia nos chamar inconscientemente. A montanha nos hipnotizara a tal pto do Ângelo até esquecer seu celular dentro do táxi.
As 13:30 saltamos na Faz. Jaboticabal (500m de alt), onde um rapaz nos recebeu na porteira e a quem entregamos a devida papelada. Uma vez dentro (e + alguns telefonemas) e alguns ajustes finais nas mochilas é q demos inicio à jornada propriamente dita. Dali ainda tínhamos 8km por precária estrada de terra serra acima, mas felizmente conseguimos carona num caminhão, q compensou nossa saída atrasada de sampa. Sacolejando novamente na caçamba do mesmo, víamos a fazenda ficar cada vez menor la embaixo, enqto ganhávamos altitude e bordejavamos as encostas de serra forrada c/ mata secundaria. A estrada já é medonha de tão precária q é, obrigando o caminhão a suar nalguns trechos, patinando em enormes piscinas de lama! Aqui calibramos nossos instrumentos p/ medição precisa de altitude e localização, tanto do gps do Ricardo qto dos altímetros do Guto e Ângelo.
Ao chegar numa encruzilhada sinalizada c/ uma placa 'Trilha do Rio Branco' (1012m), saltamos do caminhão p/ dar inicio à pernada, as 14:15. Tomamos a estreita estradinha da esquerda e caminhamos tranqüilamente, bordejando c/ aclive imperceptivel um morrao, em meio ao frescor de uma gde floresta de eucaliptos. As 14:50 caimos no q parecia ser o 'A1', um pequeno descampado parcialmente tomado pelo mato (1065m). Logo adiante a estrada se afunila + ate se tornar uma trilha larga, onde atraves da mata fechada podemos ouvir o rugido de um rio, o Rio Claro. Assim, a picada se estreita cada vez + e a mata parece se adensar a pto de invadir a trilha. Após transpor alguns brejos, contornar arvores caídas e atravessar matacoes espinhentas de carrapichos, chegamos no inicio da trilha, no 'A2', as 15hrs. Aqui não passa de uma pequena clareira c/ mato alto ameaçando dominar td, não fosse uma discreta placa indicando o inicio da trilha. Entrando na mesma, descemos em meio a um túnel de taquarinhas e muita mata fechada.
Após contornar um enorme bambuzal sob um piso crocante de folhas secas, desescalaminhamos algumas raízes ate dar, finalmente, nas margens do Rio Claro (1098m), as 15:15! Podemos constatar q o rio de fato faz jus ao nome: suas águas são de uma translucidez impar, mesmo encachoeirado, c/ belas e diferentes tonalidades de azul principalmente nos poços! Após uma inicial pausa p/ fotos é q começamos a subir o rio, q neste começo mostra-se razoavelmente fácil de percorrer, s/ gde desnivel. Isso significa saltar de pedra em pedra, ora numa margem ora noutra; escalaminhar pedras maiores c/ auxilio dos braços e pernas p/ contornar poços, paredões e cachus maiores; se arrastar por lajes inclinadas escorregadias afim de avançar; e molhar o pé qdo necessário. Em ambas as margens, encostas inclinadas forradas de muita, muita mata!
As 17:15, já atentando ao horario avancado, notamos q na margem esquerda havia um terreno relativamente 'plano' e c/ menos vegetação espessa e alta. Pois foi la mesmo q estacionamos (1111m), bastando apenas roçar um pouco o capim no chão e alguns arbustos e cipós espinhentos q tendiam a invadir as laterais. Assim conseguimos espremer 3 barracas e eu pude estender minha rede entre 2 arvores. Assim q o vale escureceu e a noite trouxe o frio, trajamos agasalhos afim de suportar a brusca queda de temperatura. Antes disso, porem, eu já havia comido minha 'marmita' e me recolhido à rede, cansado. Os d+ ainda tiveram tempo (e paciência) de preparar a janta no leito pedregoso do rio p/ depois se enfiarem em suas respectivas barracas, por volta das 20hrs. A noite transcorreu tranqüila, s/ incidentes. Apesar do frio seco e de parecer desconfortável, p/ dormir em rede ao relento basta estar cansado q td passa desapercebido, ainda + enfiado no saco-de-dormir, vestindo roupas extras e pernilongos zunindo no ouvido. De madruga acordei varias vezes p/ me ajeitar na rede, e ficava maravilhado ao ver o céu pontilhado de estrelas e uma lua espiando atraves das frestas da mata, iluminando nosso acampamento. E ao som hipnótico do marulhar do rio logo ao lado, tendia a dormir novamente o sono dos justos.

2º DIA - PRIMEIRO DESFALQUE NO QUARTETO

Levantamos naquela fria manha de sexta assim q o sol abracou o alto dos espigões da serra, as 6:10hrs! Como estávamos ao pé das montanhas, a Pda da Mina não estava visível por haverem outras cristas, tb imponentes, se interpondo no caminho. Apesar disso, o dia estava nublado e começamos a arrumar nossas coisas p/ logo partir na sequencia. Nesse meio-termo, o Guto escorregou numa pedra e caiu parcialmente na água ao tentar explorar uma encosta oposta. Por sorte não foi nada grave, mas encharcou parte da roupa q trajava.
Após um rápido café zarpamos as 8hrs, ganhando inicialmente a margem oposta do rio, q parecia + fácil de transitar. Mas logo a 'facilidade' q tivéramos o dia anterior dava lugar a uma sucessão de obstáculos e declividade cada vez maiores devido ao afunilamento do vale, tornando o terreno bem + acidentado. Escalaminhar desmoronamentos de pedras enormes p/ avançar em meio a cachus e poções tornou-se regra, demandando fôlego e gde esforço de braços e pernas. S/ falar na atenção redobrada ao encarar trechos 'fáceis': bastava pular de pedra em pedra, não fossem estas besuntadas de limo e lisas feito sabão, e outras aparentemente secas e firmes mas q eram igualmente traiçoeiras, rolando ao menor contato! Ainda assim, o Guto e Ricardo dispararam na frente, + ágeis, dispostos e confiantes; eu e Ângelo (c/ botas de solado não tao aderente) preferimos avançar c/ lentidão, porem c/ + segurança.
Não tardou e meia hora após nossa saida, ao escalaminhar alguns enormes blocos tombados, encontro o Ricardo caído c/ semblante não muito animador. Me disse q havia escorregado numa pedra, caira bruscamente sobre o ombro e quiçá bastasse um puxão p/ tentar realocar o dito cujo q, deslocado, seu osso realmente parecia saltar sobre a pele de forma assustadora! Não vou esquecer os urros de dor do Ricardo qdo o Guto e Ângelo tentaram, s/ sucesso, colocar o dito cujo de volta. Não havia jeito, ele tinha q retornar pq seu braço direito estava inutilizado. Pra complicar uma tremenda dor-de-barriga tb o acometia. Entretanto, ele frisava q voltaria mas q nos não devíamos desistir da trip, embora tal pensamento tb pairasse na nossa cabeça por conta desse incidente. Sendo assim, eu e o Guto ficamos ali esperando, enqto o Ângelo (c/ a cargueira do Ricardo) voltava c/ ele ate o inicio da trilha, de onde este poderia seguir a pé ate a fazenda, e dali ligar prum táxi leva-lo de volta a Queluz.
E la partiram ambos, as 9hrs, retornando td aquilo q havíamos palmilhado ate entao. Nesse meio-termo eu e o Guto ficamos descansando, explorando arredores, tomando conta das coisas do Ângelo ou simplesmente discutindo o ocorrido, enqto afastávamos mosquitos irritantes. O incidente nos havia deixado abalados: primeiro pq o Ricardo era quem tava melhor condicionado fisicamente e agora retornava antes da hora; segundo pq ele era o nosso navegador e usava gps como ninguem, havia plotado os ptos-chave da travessia e era o único q sabia manusear aquele trambolho q agora tava em nossas mãos, de enfeite!!! Ou aprendíamos a utiliza-lo ou nos virávamos estudando atentamente a carta q dispúnhamos p/ prosseguir. Havia um pto de acesso à crista fundamental (q chamamos de 'Pto G'), q teríamos q achar de qq jeito, do contrario seriam + 2/3 dias de volta. C/ o Ricardo esse pto seria fácil de encontrar (mesmo c/ mau tempo), mas agora isso era incerto; contávamos apenas c/ nossa experiência em farejo de trilha, leitura de mapas e sorte, principalmente! Seja o q Deus quiser. Continuamos mesmo assim, decididos, afinal não esperamos 2 anos p/ voltar de mão abanando, s/ ao menos tentar chegar ao fim...
As 13hrs o Ângelo retornou, em meio aos espelhos dagua formados pelos poços, agora realçados pelo sol de inicio de tarde. Contou q deixou o Ricardo no inicio da estrada (onde saltamos do caminhão) e q este pareceu + conformado c/ a situação e em condições de retornar o restante a pé sozinho. Demos 1hr p/ nosso bravo Ângelo descansar e comer alguma coisa e as 14hrs, retomamos nossa pernada rio acima, mesmo tendo perdido quase meio-dia por conta do ocorrido.
Continuamos nossa escalaminhada, agora c/ atenção redobrada. O passo é lento e cauteloso procurando as melhores pedras para pisar. Chegamos entao num belissimo poção azul enorme, q teve de ser contornado pela direita, na base de muito trepa-pedra. Mais acima, alcançamos outro belo poço, desta vez na base de uma linda cachu, q por sua vez so foi possível ser transposta varando mato por sua ingreme encosta esquerda. Felizmente, logo o terreno nivelou e o caminhar tornou-se menos desgastante por um bom tempo, bastando apenas andar pelas pedras, num trecho bastante bonito.
Após passar pelo q foi a fundação de uma antiga ponte, o percurso ficou outra vez terrivelmente íngreme e acidentado, demandando escalaminhada trás escalaminhada!!! A partir daqui o avanço tornou-se lento devido à sequencia de cachus, poços e paredões rochosos verticais bloqueando nosso avanço a cada degrau vencido, q exigiam serem contornados varando a encosta íngreme de bambus na base do facão ou escalando mato na raça!
As 15:40 caimos num lindo poção aos pés de outra enorme e belíssima cachu, s/ possibilidade de ascensão direta pelas pedras. Daí tivemos q nos enfiar em sua íngreme encosta esquerda, e buscar meios de chegar ao alto da cachu, escalaminhando mato, s/ nos afastar muito do som do rio, ao nosso lado. Após muita ralação na floresta, estudar terreno e nos arrastarmos pelo quebra-corpo de uma pequena grota, conseguimos descer por uma encosta de bambuzinhos, ate cair novamente no leito do rio. Apesar do avanço lento, ganhavamos altitude num piscar de olhos!
Após escalaminhar + blocos desmoronados de pedras no caminho, do Guto novamente escorregar e cair na água, e do cansaço geral começar a bater em todos, resolvemos encerrar o expediente ao perceber q o terreno estabilizara outra vez. Logo encontramos uma encosta razoavelmente plana - um quase platô - em meio ao denso e espesso bambuzal na margem esquerda (1350m), e foi la mesmo q jogamos as cargueiras. Assim, as 17:45, roçamos bem o local de forma a acomodar 2 barracas e uma rede, alem de preparar a janta antes da hora, exaustos daquele dia! Qdo a última claridade se extinguia por detrás da serra e os uivos da suave brisa chacoalhando o arvoredo já tomavam o ambiente, nos recolhemos a nossos 'aposentos' p/ dormir quase 10hrs seguidas! Desta vez não tivemos o visu do ceu estrelado por estarmos dentro de floresta fechada, mas tivemos como cia permanente os sons da mata e dos murmúrios do rio ao nosso lado.

3º DIA - ESCALAMINHADAS EM MEIO À NEBLINA

Preguiçosamente, acordamos no raiar da alvorada, as 6:15hrs. O dia estava frio, nublado e nada promissor. Olhando vale abaixo podíamos ver perfeitamente um tapete de nuvens cobrindo td baixada, deixando apenas o topo das montanhas visíveis, tal qual ilhas rochosas num mar alvo. E assim q nossas mochilas engoliram td equipamento e após um rápido café, pusemos pé-na-trilha por volta das 7:30, no frescor daquela manha de sabado.
Inicialmente andamos tranquilamente por um leito plano de pedras, mas não tardou ao terreno ficar + íngreme. Daí foi um repeteco da tarde anterior: chega num poço/cachu, contorna o mesmo varando-mato pela encosta ate retornar ao rio, e dali repetir o processo, ou escalaminhar os blocos de pedra no caminho. E assim sucessivamente. Mas ao reencontrar o rio, após descrever um grande semi-círculo pela encosta da mata p/ transpor um enorme poço, caímos em seu largo leito... seco!?
Continuamos em frente, mas daí veio a duvida se estávamos de fato indo pelo rio correto, uma vez q ouvíamos a água correndo bem + à esquerda, no meio da mata. Sera q passamos alguma bifurcação desapercebidos? Foi ai q entao paramos p/ pensar (1400m), examinar melhor o mapa, fuxicar o gps e nos separarmos p/ ver se estávamos no caminho certo. P/ complicar, uma forte neblina tomou conta do vale conferindo-lhe um certo charme jurássico, quase mistico, mas tornando impossível avaliar a carta c/ o terreno a nosso redor. Como o Ângelo havia ido rio acima, eu fui na direção oposta apenas p/ chegar a conclusão q estávamos na direção correta e q a água q se ouvia era apenas alguma ressurgencia do rio naquele trecho seco. Não sabendo por qto tempo ficaríamos s/ água, enchemos nossos cantis e seguimos adiante, agora escalaminhando forte as pedras c/ mto + facilidade pelo rio seco. Ou quase, já q a neblina se encarregava de umedecer de leve as rochas.
Não demorou a reencontramos a água correndo novamente pelo rio, logo adiante, apenas p/ sublinhar q estávamos no sentido correto. Após contornar uma bela cachu pela direita em meio à mata, veio um longo trecho de subida de rio por gdes lajotas inclinadas e largas rampas de pedra, algumas das quais avançamos c/ ajuda da vegetação servindo de corrimão. Assim, as 11hrs tivemos um breve pit-stop p/ beliscar alguma coisa, sentados à beira de um enorme poção (1525m). O tempo ameaça limpar, mas era pura ilusão. O grosso nevoeiro insistia em perdurar ate o final do dia. So torcíamos p/ q ele não perdurasse ate o dia sgte, pq ai sim a coisa complicaria.
Continuando a dura pernada, as 11:15 topamos c/ um riachinho despencando na forma de uma gde cachu no rio q palmilhavamos, à nossa esquerda (1571m), mas não desviamos nosso percurso, cujo ritmo e sentidos permanecem inalterados. Mais adiante o vale parece se afunilar num cânion, nos obrigando a bordejar os obstáculos sgtes atraves do mato da encosta. Contudo, cada obstáculo vencido acaba num lindo visu q justifica breves paradas p/ descanso e contemplação, mesmo c/ tempo enevoado! Mas qdo aparecem novos obstáculos, eis q o Guto, nosso 'geógrafo-engenheiro', tem a gde ideia de - ao invés de contornar pelo mato - improvisarmos 'pontes' ou 'escadas' seja c/ pedras ou troncos p/ seguir adiante, ideia q veio a calhar em + de uma ocasiao. Entretanto, um paredão enorme logo adiante nos obriga a seguir pela íngreme encosta de mato, q por sua vez demandou o uso de corda pela 1ª vez na empreitada: feito lagartixa, Guto escalou a encosta p/ depois puxar as pesadas cargueiras c/ a corda, permitindo q depois escalássemos a piramba s/ maiores dificuldades! E nada da neblina se dispersar.
Após escalaminhar (c/ corda) um novo paredão vertical ao lado de uma cachu, resolvemos dar um novo tempo p/ descanso, as 14:30, agora ao pé de uma enorme garganta, na qual pareceu q estávamos literalmente emparedados (1745m) por duas enormes muralhas de rocha! O rio agora espremia-se neste corredor de pedra q, por sua vez, sempre apresentavam fezes de algum bicho.
Dando continuidade à escalaminhada e apos contornar no mato uma enorme rocha partida no meio do rio, aparece na nossa frente uma muralha de rocha q podia ser vencida apenas numa setor onde haviam lajotas inclinadas úmidas (e escorregadias) q davam acesso à continuidade do rio, logo acima (1770m). Novamente a corda foi fundamental p/ podermos transpor + esta barreira, q parecia não ter fim. Foi ai q, as 16:30, a neblina se dispersou permitindo q um maravilhoso visu se descortinasse; pudemos apreciar td q havíamos subido ate entao, c/ o estreito cânion serpenteando td vale, q se estreitava logo abaixo. Na baixada, td horizonte ainda estava tomado pela densa camada de nuvens que dançava ao embalo das brisas. Mas o melhor era poder vislumbrar o cume dos enormes maciços à nossa volta resplandecendo à luz do sol daquele final de tarde! Maravilhoso!
O dia quase findo nos lembrava da necessidade de parar. Perdidos em meio à admiração da paisagem e muitos cliques, constatamos q o local em q estavamos era o único razoavelmente plano p/ acomodar 2 barracas apertadas. Do lado de um enorme lajedo q nos serviu de cozinha e um poção tinindo de gelado q nos supriu da água necessária, foi ai q encerramos o expediente do dia, s/ pestanejar (1800m)! Não houve mta necessidade de roçar nada, o local era perfeito. No entanto, ali era bastante frio; havíamos subido o bastante já p/ sentir a mudança de clima, alem da de vegetação, já q não haviam + arvores de gde porte, o q me obrigou a pernoitar na barraca do Ângelo. Assim q escureceu nos agasalhamos por completo pq o frio era de lascar. Preparamos nossa janta enqto a noite se coalhava de zilhoes de estrelas, q se refletiam no espelho dagua do poção ao nosso lado! C/ a noite tb vieram os mocozinhos - ratinhos selvagens - atrás de sobras, o q nos obrigou a levar td comida p/ dentro das barracas. Satisfeitos e vencidos pelo cansaço, na sequencia nos recolhemos à nossas humildes choupanas e dormimos a noite toda num sono só, apesar do frio q esteve proximo dos 4ºC.

4º DIA - ESCALADA NERVOSA E CONQUISTA DA MINA

O domingo amanheceu radiante, c/ ceu limpo e bastante promissor. Levantamos cedo na expectativa e ansiedade por achar o tal 'Pto G' de acesso à crista, e de atingir o cume da Pda da Mina. Diferentemente do dia anterior, estávamos + confiantes e decididos; a navegação visual era perfeitamente possível já q agora podíamos avaliar a crista a seguir, cada vez + próximas. Alem disso, o Ângelo já sabia ler as coordenadas no gps, e o Guto podia precisar nossa posição na carta, principalmente atraves da altitude! Puro trabalho em conjunto! Enfim, nos sentíamos num 'Nido de Condores' prontos p/ ataque deste 'Aconcagua' tupiniquim. Animados, arrumamos as coisas, tomamos café e zarpamos as 7:30.
De cara tivemos q escalaminhar um mato p/ transpor uma pequena cachu, p/ depois seguir pelas pedras e bordejar uma colossal área de desmoronamento. Novamente no leito do rio, cada vez c/ menos água, uma bifurcacao nos obriga a tomar a direita e, as 8:10, uma nova bifurcacao nos leva à esquerda, sempre acompanhando o curso dágua. Entretanto, esta outra bifurcacao era marcada por uma enorme cachu q deveríamos escalar ate o topo, q demandou novamente o uso da bendita corda. Após cautelosa escalaminhada, nos esgueiramos por uma estreita canaleta no paredão, adentramos numa pequena grota, ate emergir atraves de um buraco no alto da mesma, as 9hrs! A vista daqui de cima era fantástica: alem do rio serpenteando vale abaixo, viamos um espesso mar de nuvens atrás, na baixada.
A partir daqui o rio já quase nem água tinha, apenas pequenos filetes escorrendo aqui e ali. E como seu leito cada vez se reduzia +, ficou ate relativamente fácil seguir em meio as gdes pedras do percurso, bem + seco apesar de ingreme. Assim, galgamos sucessivos degraus em meio ao frescor de uma ultima mata alta, ate cair noutra bifurcacao (1970m), as 9:50, onde obviamente tomamos à esquerda, segundo a carta. Algumas marcas de facão e vestígios de pisadas apenas nos cobriam de razão qto o sentido a seguir.
Daqui em diante avançamos desimpedidamente por um leito seco e logo atraves de uma pequena garganta, q foi vencida por sucessivas lajes inclinadas, ganhando altura respeitavelmente. O trajeto se afunila mais, ate sermos espremidos por estreitas fendas (2100m). As 11:20, o visual muda por completo. Agora no aberto, a mata alta deu lugar a vegetação rala de altitude (caratuvas, capim e bambuzinhos) e as cristas e maciços pareciam estar ao alcance de nossos dedos, dourados pelo sol matinal, de tao próximos q estavam! Foi ai q o Ricardo ligou pelo celular, as 11:30, p/ nos contar de seu estado e q havia chegado bem, alem de nos desejar boa sorte.
Andando agora atraves de uma vala-canaleta larga (2200m), escalaminhando pedras e lajes inclinadas, caímos na ultima bifurcacao, na qual surgiram algumas duvidas sobre q rumo tomar. Mas estudando a carta, o gps e avaliando a crista + próxima, decidimos seguir pela direita, onde havia menos água. Seguiu-se um longo trecho de escalaminhada de rochas umidas sucessivos e algum vara-mato na encosta, ate q finalmente chegamos no q parecia ser um colo de serra, um selado na crista, onde o riachinho simplesmente terminava ao sopé de um enorme e largo paredão onde devia haver alguma cachu no verão, as 13:15. Pela descrição passada, aquele local correspondia exatamente ao tal 'Pto G' (2343m). Estávamos na Nascente do Rio Claro!!! Agora so faltava subir à crista...
Após cliques e algum descanso, avaliamos o terreno afim de alcancar a crista propriamente dita, uns 70m piramba acima. Do lado direito do paredão havia uma encosta rochosa menos íngreme e forrada de capim q parecia ser o melhor local p/ subir. Foi ai q começou o trecho + adrenado e perigoso de td trip! Primeiro fomos eu e o Guto, escalando as aderências e escarpas do paredão, nos agarrando ao escasso capim disponível. Mas após uns 40m a piramba ficou quase vertical, forrada de pequenas touceiras de capim-elefante e dificil de avançar! Como não podíamos descer, eu e Guto nos ancoramos na raiz do único arbusto maior do paredão p/ decidir o q fazer. Daí ele resolveu avançar, s/ arrastando encosta acima s/ mochila, amarrado na corda (presa ao arbusto), afim de ancorar a mesma nalgum pto + seguro, la no alto. E la foi ele, feito um calango, ate um tempo depois gritar do alto dizendo q havia chegado num local seguro. Foi ai q o Ângelo me alcancou. Confesso q tava me borrando td e tive serias duvidas se conseguiria subir: estávamos ali, a quase 40m verticais no alto, totalmente expostos, ancorados na raiz de um mirrado arbusto, e ainda teria q subir na raça por um terreno não mto instável me agarrando a mato seco pouco confiável???? Já havia tido um experiência nada agradável no Petar, onde o mato havia cedido e eu despencara de quase 30m. A diferença daqui é q a altura era maior e não havia arvore alguma q me amparasse em caso de queda! C/ coração a mil, respirei fundo e la fui eu, evitando olhar p/ baixo. Me segurando na corda, me arrastei lentamente barranco acima, agarrando fortemente o capim disponivel e chutando o chão de terra afim de criar apoios q me impulsionassem p/ cima, pisando tb nas raízes das touceiras de capim-elefante proximas. Após um trecho q pareceu uma eternidade, consegui sair, aliviado, daquele pto critico, embora c/ as mãos e corpo td retalhado pelo afiado capim. Dali bastou me arrastar ajoelhado em meio ao capinzal, e subir na diagonal beirando um enorme lajedo, pra depois encontrar o Guto noutro arbusto (bem + seguro) logo acima. Ufaaaa! Agora bastava eu e ele puxarmos o Ângelo, q alem da pesada cargueira dele tb deveria trazer a do Guto. Mas como o Ângelo é pau-p/-td-obra, conseguiu escalaminhar esse árduo trajeto c/ duas mochilas e um 'pé nas costas'!
Dali em diante bastou galgar s/ maiores dificuldades o restante da encosta ate desabar, as 15hrs, nos lajedos planos e asperos de um ombro de serra (2430m), ainda abaixo da crista. Descansamos aliviados, comemos algo e batemos muitas fotos de td extensão do Vale do Rio Claro e dos penhascos ao redor, q agora deixávamos p/ trás! Na sequencia subimos bravamente em meio ao capinzal e algumas rampas de pedra ate atingir, finalmente, a crista da serra!
Atingir a Mina agora era questão de tempo. A passos lentos em meio a enormes touceiras de capim-elefante q obstruem nossa visao e retardam o avanço, chegamos à base da Pedra da Mina. E apos longos e vagarosos ziguezagues por trilha obvia (e batida) numa encosta suavemente inclinada e forrada de capim ralo, atingimos finalmente os 2798m do seu largo topo, lotado de totens, um marco geodésico e um livro de cume!!! Uma alegria indescritível tomou conta de tds nos, afinal após 4 penosos dias alcançamos nosso objetivo! O visu panorâmico de 360º la de cima sempre vai me impressionar: enxerga-se quase td extensão da Serra Fina de um lado, c/ o Marins-Itaguaré ao fundo, à oeste; cidadezinhas sul-mineiras ao norte; outras tantas do Vale do Paraíba, c/ a Bocaina , ao sul; e a outra extremidade da Serra Fina, c/ as escarpas pontudas de Itatiaia no fundo, à leste! Isso s/ falar nas varias encostas abissais da serra despencando p/ td lado - ora por suaves espigoes ora abruptamente em direção à baixada - e do sensacional Vale do Ruah, bem ao nosso lado!
Acomodamos nossas barracas s/ dificuldade alguma no topo, juntamente c/ um quarteto de Limeira q palmilhava a travessia convencional e c/ quem dividimos estes momentos únicos: a alegria da conquista ou de simplesmente estar ali! E enqto a sombra da montanha se esparramava pela baixada tal qual uma gigantesca pirâmide, o sol se punha no horizonte na forma de um gde disco avermelhado mergulhando nas brumas do ocidente! O vento frio q já soprava tornou-se glacial assim q a noite caiu, obrigando a nos agasalhar confortavelmente, ao mesmo tempo q o fogareiro preparava nossa ultima e bem-vinda janta. Na sequencia nos entocamos, mas não s/ antes apreciar as luzes de Cruzeiro, Passa-Quatro e Queluz faiscarem aos nossos pés tal qual as zilhoes de estrelas despontando no breu noturno, logo acima! Diferentemente das noites anteriores, nas quais dormi feito pedra, aquela lá foi uma sucessão de cochilos. Não sei se devido à altitude, à coceira dos trocentos arranhões/feridas pelo corpo ou ao insistente desejo por um banho quente. Ou quiçá fosse devido ao frio, q beirou quase os zero graus, ou à constante trepidação das frágeis estruturas da barraca, fustigadas pelo forte e frio vento.

5º DIA - A LONGA DESCIDA AO PAIOLINHO

Levantamos cedo naquela manha fria afim de ver a magnifica alvorada q se descortinou, c/ o Astro-Rei emergindo atrás de Itatiaia, silhuetando os espigões recortados de Agulhas Negras num fundo tingido de vermelho e ouro, enqto um mar de nuvens começava a se dispersar sobre a baixada. Protegidos do vento frio cortante, tomamos nosso mirrado desjejum - no qual o Ângelo dividiu seu lanche comigo - e arrumamos nossas coisas, s/ pressa. Tivemos tempo ate de conversar c/ uma dupla de paulistas q recém-chegava, realizando a travessia convencional em 2 dias(!?). Foi ai q um dos integrantes do quarteto de Limeira, o Fabiano - percebendo q não daria conta de completar a pernada c/ sua trupe - se juntou à nós na volta pelo Paiolinho. Alias, a inclusão do Fabiano no quarteto não podia ter vindo em melhor hora: alem de gente finissima, já tinha engatilhado resgate p/ gente no final, algo q sequer havíamos cogitado!!!
Assim, as 8:50 comecamos a descer a Pda da Mina, dando adeus aquele belo e ermo local. Tomamos uma crista q dali partia sentido noroeste/norte, atraves de lajotas de pedras. Detalhe: nenhum de nos conhecia essa tal Trilha do Paiolinho, mas tb nem precisou, pq a profusão de totens indicando a dita cuja não dá margem de erro! Pegamos uma crista bordejando o Ruáh, p/ depois, em suaves sobe-desce por encostas forradas de caratuvas, túneis de bambus, macelas e capim-elefante. Assim q ganhamos o alto de outra crista maior é q comeca a descida definitiva, bem forte e íngreme durante um booom tempo! Apesar de ser descida, td este trecho foi feito c/ lentidão e cautela, não apenas p/ poupar o joelho de maiores impactos, mas pq a trilha era bem exposta, no aberto, em meio a pedras soltas ou em solo arenoso, tremendamente escorregadio! A paisagem das imponentes cristas ao redor despencando em vários espigões forrados de verde e algumas cachus, compensava o esforço.
Perdendo altitude imediatamente e c/ sol na cara, logo começamos a sentir sede. Nossa água tinha ido p/ espaço faz tempo, mas assim q a piramba adentra uma encosta e, a seguir, numa pequena florestinha de arbustos, exultamos de alegria ao esbarrar, as 11:45, num pequeno córrego onde descansamos e nos deliciamos c/ o precioso liquido (2000m)! Não demorou p/ rala e ressequida vegetação dar lugar a vales c/ florestas q nos presentearam c/ o frescor de sua sombra nas horas sgtes. E as 12:45 cruzamos um riachinho maior; contudo, de volume insuficiente p/ banho merecido. Mas ainda descendo e bordejando a encosta suavemente, as 13:20 caimos num belíssimo rio repleto de poços e pequenas cachus, onde paramos p/ dar breve tchibum em suas águas geladas. Afinal, já ninguém + suportava o proprio corpo sujo de quase 5 dias s/ banho!
Revigorados, continuamos a pernada c/ o resto de energias q dispunhamos, mas o cansaço acumulado não tardou em fazer c/ q literalmente nos arrastássemos, combalidos e exaustos, mesmo palmilhando terreno plano em área rural. Ate q as 14:20 caimos na Faz. Serra Fina, na esperança q celular pegasse e o resgate do Fabiano viesse ali nos buscar. Afinal, eram quase 18km ainda ate o asfalto! Infelizmente o celular não pegou, nos obrigando ainda a descer - agora por estrada poeirenta de terra - por mais 3 interminaveis km ate o Bairro do Paiolinho, onde segundo o Zé Ramos, um senhor q conehcemos ali, celular pegava alem de haver um boteco. Na verdade este ultimo item era o q realmente ainda me motivava a andar, já q o resgate era apenas detalhe.
Assim, nos arrastando a duras penas, alcançamos o pacato bairro rural do Paiolinho (1390m) as 15:10, onde desabamos no chão, + precisamente na frente do Bar do Seu Sival. La conseguimos ligar pro resgate do Fabiano, alem de bebemorar animadamente o sucesso da empreitada! O tempo foi passando, passando e passando e nada do resgate. Acreditando q nosso resgate se perdera nalgum fim-de-mundo, resolvemos fretar a Kombi do Sival p/ nos levar a Itanhandu, mas não deu nem 5km de estrada q demos de cara c/ nosso resgate, as 18:30, p/ desgosto do Sival, cujo olhar tilintara altos cifrões conosco.
Imediatamente zarpamos p/ Itanhandu e Passa-Quatro, onde constatamos já não havia busao q nos levasse de volta à sampa. Nisso, o Fabiano ofereceu gentilmente a casa de seus tios (q moravam em Itanhandu) p/ pouso, oferta q não pensamos duas vezes em aceitar! Assim, Dna Carminha & Seu Helio nos receberam com td tradicional hospitalidade mineira imaginaveis, alem de uma suculenta e farta janta q fariam Baco corar de inveja, e da qual não sobrou nada nos pratos! C/ direito até a 3 repetecos deste q vos escreve! Como era bom comer 'comida' novamente! Banho tomado, não deu tempo p/ mais nada q desfalecemos nas macias camas q nos haviam reservado, e das quais não arredamos pé ate a manha sgte.
Na terça levantamos cedinho, tomamos um delicioso café-da-manha e nos despedimos de nosso gentis anfitriões. Zarpamos p/ rodoviária e tomamos o primeiro busao p/ Cruzeiro, as 8:15. Uma vez la, tomamos o busao p/ sampa as 10:30, onde chegamos por volta das 14hrs. Moídos, claro, mas felizes por estar cientes do dever cumprido!

E assim foi nossa epopéia de 5 dias vividos intensamente no coração da Mantiqueira nessa dura e árdua pernada. 'Travessia do Rio Claro', 'Serra Fina Norte-Sul' ou 'Pedra da Mina Transversal'. Os vários nomes q a nominam pouco importam. Importa sim é q conseguimos atingir - c/ méritos proprios - o alto da Pedra da Mina pelo lado paulista. Cansaço, ralados, arranhões, contusões, dores musculares. Essas são as lembranças e marcas menores recorrentes desta travessia selvagem ao extremo. Mas ninguém reclama, claro! A satisfação de enfrentar os caminhos mais remotos, intocados e ásperos desta Mantiqueira menos conhecida - em plena região sudeste - onde a busca de paisagens pouco vistas supera, em muito, os percalços da jornada. Enfim, é uma travessia q premia os fortes, e as recompensas naturalmente suprem o esforço.


Jorge Soto
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Por Jorge Soto
______ Designer por profissao
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SERRA FINA NORTE-SUL: TRAVESSIA DO RIO CLARO
Por Jorge Soto / Fotos: José Augusto C.




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Crepúsculo do alto da Pedra da Mina